terça-feira, 23 de abril de 2013

Boston, Tchetchênia e um lugar chamado ideologia

POR DIOGO BERCITO
21/04/13




Editoria de Arte/Folhapress
Eu estava na casa de um colega jornalista, em Jerusalém, quando a televisão noticiou o atentado a bomba em Boston. Nos reunimos ao redor da tela enquanto levantávamos nossas próprias teorias a respeito do ataque. Até então, não se sabia quase nada sobre o incidente. Queríamos entender, em especial: por quê?
Saímos para jantar. Nas ruas, jovens israelenses celebravam o dia da independência do país. Mas nós estávamos vidrados em nossos smartphones. Como os demais jornalistas por aqui, passamos os dias seguintes deslizando o dedão na tela para atualizar o feed de notícias do Twitter.
Por enquanto, dois irmãos de origem tchetchena são suspeitos pelo ataque que matou três e deixou mais de 170 feridos em uma maratona nos EUA. Na tentativa de capturá-los, um dos rapazes morreu e o outro está ferido. Mas, por mais que as investigações tenham avançado, a pergunta que nós nos fizemos diante da TV continua valendo: por quê?
É muito cedo para teorias. Mas as autoridades de contraterrorismo agora olham para a região do Cáucaso e tentam estabelecer qual é a relação, se houver alguma, entre a origem dos irmãos e a decisão de detonar bombas em Boston.
Não para dizer que o lugar de origem justifica ou condiciona um ataque –mas para tentar entender, ao menos, a que ideologia os terroristas estiveram expostos antes de imigrar para os Estados Unidos.
Ao que parece, um dos irmãos esteve recentemente nas regiões do Daguestão e da Tchetchênia, e é esse fio que a investigação irá seguir nos próximos dias. Em ambos os lugares há hoje um violento movimento separatista que levou a guerras e a um histórico de terrorismo, a partir dos anos 1990.
Daguestão, Tchetchênia, Cáucaso e Rússia são nomes de que vamos ouvir falar, nos próximos dias. Mas também haverá quem mencione o nome de um outro lugar, imaterial: o wahabismo.
Essa vertente radical do islã, surgida na península Arábica, é uma das bases da construção do reino da Arábia Saudita. É um dos pilares da interpretação rígida da sharia, a lei islâmica, razão pela qual mulheres são impedidas de dirigir ou sair do país sem a autorização de um “guardião” masculino.
O wahabimo leva o nome de seu criador, Muhammad ibn abd al Wahab, um teólogo do século 18 que contestava as inovações do islã como sendo deturpações religiosas. Esse movimento salafista ganhou força na península com a aliança entre Abd al Wahab e Muhammad ibn Saud –da família que mais tarde construiria a Arábia Saudita (daí o nome). Até hoje, o reino saudita investe milhões de dólares na propagação dessa ideologia.
O wahabismo, como expoente fundamentalista, mira em um passado distante como maneira de solucionar as crises contemporâneas. Dessa maneira, olha para os primórdios do islamismo e salta, assim, os séculos de discussões teológicas. O que significa, entre outras coisas, que o muçulmano wahabi não necessariamente adere à tradição do “fiqh”, a jurisprudência islâmica.
Insisto que tudo, por enquanto, são suposições. É bom deixar claro, também, que wahabismo não significa terrorismo, e de maneira alguma este blog faz qualquer julgamento teológico ou ideológico sobre o islã.
De qualquer modo, a quem estiver interessado, as ideologias islâmicas são fontes ricas para o debate e para o melhor entendimento da região. Nunca será demais estudá-las a fundo. E o contexto histórico, ao que parece, está nos sugerindo que estejamos atentos ao wahabismo ao menos pelos próximos dias.
Procurando mais informações, me deparei com uma conta falsa no Twitter, em que o usuário escreve sarcasticamente sobre fundamentalismo islâmico. Abaixo, um tuíte.

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