domingo, 25 de novembro de 2012

Espanha rejeita negociação com grupo separatista basco Eta


Organização se ofereceu para conversar sobre ‘fim definitivo’. Espanha só aceita dissolução

 MADRI - Neste domingo, a Espanha rejeitou uma oferta do grupo separatista basco Eta para conversar com os governos da Espanha e França para negociar um “fim definitivo” de suas operações militares.
O ministro do Interior, Jorge Fernandez Diaz, disse que a Espanha não vai negociar com uma “organização terrorista” e exigiu “dissolução incondicional” do Eta. O País Basco fica na fronteira entre a Espanha e a França, que apoia a opinião de Madri nas negociações.
O Eta lutou por 45 anos pela independência basca. Porém, o grupo armado perdeu apoio nos últimos anos. No ano passado, a organização anunciou o fim de sua campanha de violência.
O governo espanhol quer que o grupo se dissolva completamente e entregue as armas. O comunicado publicado no site do jornal basco “Gara” sugere que o Eta está pronto para negociações, mas coloca condições para a dissolução, que incluem a transferência de presos bascos para prisões mais perto de suas casas.
Em resposta, o ministro do Interior disse: “Eles sabem que nós não negociamos nem vamos negociar de forma alguma com uma organização terrorista”.
“Então, a única declaração que o governo exige, não pede, mas exige e está trabalhando para isso, é a sua dissolução incondicional”, acrescentou Jorge Fernandez Diaz.
Acredita-se que o Eta é responsável por mais de 800 mortes, e é considerado uma organização terrorista pela União Europeia e os EUA. O grupo, porém, se enfraqueceu nos últimos anos, pela perda de apoio entre o povo basco e por algumas prisões, incluindo a do suposto líder da organização, em outubro.
A abertura do Eta para negociações aconteceu um dia antes das eleições na região espanhola da Catalunha, nas quais os nacionalistas catalães, que pedem um referendo sobre a independência da região, devem sair bem-sucedidos.

http://oglobo.globo.com/mundo/espanha-rejeita-negociacao-com-grupo-separatista-basco-eta-6825785

Dias Santos e Festas para o Mundo Muçulmano


Ashura (10 de Muharram, o primeiro mês): o Dia da Expiação muçulmano, assinalado pelos sunitas com um jejum voluntário. É também o mais importante dia santo xiita, que celebra o martírio de Hussein, neto do Profeta.

Eid milad ai-nabi (12 de Rubi al-awwal, o terceiro mês): Comemoração do nascimento do Profeta.
Laylat ai-micraj (27 de Rajub, o sétimo mês): comemora a ascensão de Maomé ao Céu. Também chamado Shab-e mi'raj e Miraj gejesi nas sociedades asiáticas não-árabes.

Laylat ai-bara'a (14." noite de Sha'ban, o oitavo mês): a noite em que, segundo a crença comum" o destino de cada ser humano para o próximo ano é registado no Paraíso. É marcado por vigílias de oração e festas e iluminações de ruas. No Sul e Sueste Asiático é também o dia muçulmano dos mortos, em que são feitas oblações em nome dos antepassados falecidos. É também a véspera do aniversário do décimo segundo imã dos xiitas dos Doze Imãs. Esta noite é também chamada Shab-e barat.

Ramadão: Nome do nono mês do calendário islâmico, assinalado por um jejum durante todo o mês, que se inicia antes do nascer do sol e termina a seguir ao pôr do sol de cada dia.

Laylat ai qadr (a noite entre os dias 26 e 27 do Ramadão, o nono mês): a Noite do Poder. Aniversário da noite em que o Alcorão foi pela primeira vez revelado a Maomé. Segundo a tradição, os pedidos feitos a Deus durante esta noite são concedidos. Também chamada Shab-e qadr e Kadar gejesi nas sociedades asiáticas não-árabes.

Eid ai-Fitr (1 de Shawwal, o décimo mês): a festa que assinala o fim do Ramadão. O segundo feriado mais celebrado do ano islâmico e que é marcado por muitas festividades. Também chamado o Pequeno Eid ou o Eid de Açúcar.

Hajj (7 a 10 de Dhu al-hijja, o décimo segundo mês): a peregrinação ritual obrigatória a Meca e aos seus arredores, que constitui um dos Pilares da Prática do Islamismo. Só os peregrinos participam directamente nestes dias santos.

Eid ai-Adha (10 de Dhu al-hijja, o décimo segundo mês): comemoração do sacrifício por Abraão do seu filho Ismael (Ismacil em árabe), o qual marca o final do Ha.ii. É o feriado mais importante do calendário islâmico. Também chamado o Grande Eid ou o Eid do Sacrifício.

Fonte: ELIAS, Jamal J. - Islamismo, Ed. 70, Lisboa, 1999.
http://www.netprof.pt/netprof/servlet/getDocumento?id_versao=11166

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Violência continua e cresce pressão internacional por trégua em Gaza


Escalada de violência pode adiar primárias de principais partidos em Israel e eleições, agendadas para janeiro

19 de novembro de 2012 
Reuters

FAIXA DE GAZA - Israel bombardeou nesta segunda-feira, 19, dezenas de supostos redutos de militantes na Faixa de Gaza, e os palestinos continuaram disparando foguetes contra cidades no sul israelense, enquanto se intensifica a pressão internacional por uma trégua no conflito que já deixou 100 palestinos mortos e outros 900 feridos em seis dias.
Em uma decisão anunciada hoje, as primárias dos partidos Likud (governista) e Avodá (de esquerda), marcadas para 25 de novembro, poderão ser adiadas. De acordo com o presidente do Parlamento, o deputado Reuven Rivlin, as eleições agendadas para 22 de janeiro também poderão ser adiadas por conta da escalada de violência. A informação é do jornal Israel Hayom.
Doze civis palestinos e quatro combatentes foram mortos nos bombardeios de hoje. Autoridades locais dizem que mais de metade das vítimas fatais era composta por não combatentes. Três civis israelenses também foram mortos. Após uma madrugada de relativa calma, militantes da Faixa de Gaza dispararam 12 foguetes contra o sul de Israel num intervalo de dez minutos, sem causar vítimas, segundo a polícia israelense. Um dos projéteis caiu perto de uma escola, que estava fechada no momento.
As mortes de 11 civis palestinos em um bombardeio no domingo motivaram novos apelos internacionais pelo fim dos seis dias de hostilidades. O fato também pode colocar em xeque o apoio ocidental a uma ofensiva que Israel diz ser justificada pela autodefesa, após anos sofrendo ataques de foguetes. Os militares israelenses não comentaram relato do jornalHaaretz, segundo o qual a casa da família Dalu foi atingida por engano, numa ação que tinha como alvo um especialista em foguetes do grupo islâmico Hamas, que governa Gaza.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, é esperado no Cairo para dar peso às tentativas de mediação feitas pelo governo do Egito. A imprensa israelense disse que uma delegação do país também está no Cairo, mas o governo do premiê Binyamin Netanyahu não quis comentar essa informação.
Falando em Bruxelas antes de uma reunião de ministros das União Europeia, o chanceler italiano, Giulio Terzi, disse haver condições para "um cessar-fogo nas próximas horas", e que o governo de Israel sinalizou "não haver interesse algum" em invadir Gaza. "Obviamente, essa moderação israelense deve se basear numa garantia de que os lançamentos de foguetes devem parar", acrescentou. Na segunda-feira, a China pediu aos envolvidos que parem a violência, e o presidente dos EUA, Barack Obama, afirmou no fim de semana que seria "preferível" se Israel não invadisse Gaza por terra.
A presidente Dilma Rousseef conversou no domingo por telefone com o presidente egípcio, Mohammed Mursi, e com o secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, sobre a crise no Oriente Médio. Segundo o Blog do Planalto, Dilma manifestou a Ban "a preocupação do Brasil com o uso desproporcional da força no conflito entre Israel e a Palestina, e disse que é importante que as Nações Unidas assumam plenamente as suas responsabilidades na questão.
Nas redes
Izzat Risheq, assessor da liderança política do Hamas, escreveu no Facebook que o grupo só aceitará uma trégua se Israel "parar sua agressão, acabar sua política de assassinatos dirigidos e suspender o bloqueio a Gaza".
Pelo Twitter, o vice-premiê israelense, Moshe Yaalon, listou as condições do seu governo: "Se houver tranquilidade no sul e nenhum foguete ou míssil for disparado contra os cidadãos de Israel, nem ataques terroristas forem engendrados a partir da Faixa de Gaza, não haverá ataque". Yaalon disse também que Israel espera o fim da atividade guerrilheira de palestinos na vizinha península do Sinai, região desértica e pouco vigiada que pertence ao Egito.
Israel bombardeou cerca de 80 locais em Gaza durante a noite, segundo os militares, que acrescentaram em nota que os alvos incluíam "locais subterrâneos para o lançamento de foguetes, túneis do terrorismo e bases de treinamento", além de "edifícios pertencentes a operadores terroristas graduados". Netanyahu diz ter dado garantias aos líderes mundiais de que Israel vai se empenhar ao máximo para evitar vítimas civis em Gaza. Mas pelo menos 22 dos mortos na região até agora foram crianças, segundo fontes médicas.
A China, que tem desenvolvido boas relações com Israel, disse na segunda-feira estar extremamente preocupada com as operações militares de Israel em Gaza. "Condenamos o uso excessivo da força causando mortes e ferimentos entre pessoas comuns inocentes", disse Hua Chunying, porta-voz da chancelaria. Antes de embarcar para o Cairo, Ban pediu a Israel e aos palestinos que cooperem com os esforços do Egito na busca por um cessar-fogo.
Em cenas que lembravam a invasão israelense a Gaza no inverno boreal de 2008/09, tanques, artilharia e infantaria se concentraram em acampamentos ao longo da fronteira - um trecho de areia rasgado por uma cerca de arame farpado -, enquanto comboios militares se deslocavam pelas estradas da região. Israel autorizou a convocação de até 75 mil militares reservistas, e até agora mobilizou cerca de metade deles.
http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,violencia-continua-e-cresce-pressao-internacional-por-tregua-em-gaza,962206,0.htm

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Nasa mostra retrato do ar na Terra

O Estado de S. Paulo
15 de novembro de 2012


A Nasa divulgou uma imagem de alta definição que mostra concentrações na atmosfera de poeira (em vermelho), levantada da superfície pelo vento; de sal marinho (azul), carregado por ciclones; de fumaça (verde) produzida por incêndios; e de partículas de sulfato (branco), emitidas por vulcões e combustíveis fósseis.

http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,nasa-mostra-retrato-do-ar-na-terra,960836,0.htm

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

China conclui hoje transferência de poder para comitê liderado por Jinping


É a mais ampla transição política em uma década; novo dirigente também assume direção das Forças Armadas

15 de novembro de 2012 
Cláudia Trevisan, correspondente em Pequim
PEQUIM - A China concluiu nesta quinta-feira,15, sua mais ampla transição de poder em uma década, com a escolha de Xi Jinping para a chefia do Partido Comunista, a mais importante posição na hierarquia de comando do país. O novo dirigente também assumiu a direção das Forças Amadas, o que fortalece sua posição para enfrentar os problemas diante da organização, entre os quais destacou a corrupção.
Os novos integrantes do órgão de cúpula do partido - o Comitê Permanente do Politburo - apareceram diante da imprensa às 11h55 de hoje em Pequim (1h55, horário de Brasília). Xi Jinping, 59, comandará a nova geração de líderes ao lado de Li Keqiang, 57. Ambos dividirão o poder com os demais cinco integrantes do Comitê Permanente, todos mais velhos: Zhang Dejiang, 65, Yu Zhengsheng, 67, Liu Yunshan, 65, Wang Qishan, 64, e Zhang Gaoli, 65.
No modelo de direção colegiada estabelecido na China, Xi Jinping precisará do apoio de seus pares no órgão para definir os rumos do país nos próximos cinco anos, ao fim dos quais será realizado um novo congresso do Partido Comunista.
A maioria dos analistas acredita que o Comitê Permanente do Politburo eleito ontem pelo Comitê Central do Partido tem um caráter conservador. Dois reformistas que eram cotados para entrar no organismo foram preteridos: Wang Yang, 57, o chefe "liberal" da província sulista de Guangdong, e Li Yuanchao, 61, responsável pelo Departamento de Organização do Partido Comunista.
A tendência à continuidade é enfatizada pelo fato de que todos os eleitos para o órgão de cúpula já integravam o Politburo, a entidade de 25 membros que ocupa o segundo lugar na hierarquia de poder da China.
No discurso que realizou depois da apresentação do grupo, Xi Jinping afirmou que o Partido Comunista é o grande responsável pela "renovação" da nação chinesa depois das dificuldades e turbulências enfrentadas no período moderno - quando o país foi ocupado por potências estrangeiras e dividido pela guerra civil.
Mas ele ressaltou que a organização está diante de "severos desafios", entre os quais destacou a "corrupção"  e o "recebimento de propinas" por seus dirigentes, muitos dos quais estão "fora do alcance" da população.
"Nossa responsabilidade é trabalhar com cada camarada do partido para assegurar que o partido supervisione sua própria conduta e imponha estrita disciplina", declarou em discurso transmitido ao vivo pela TV estatal.
A transição de poder ocorreu sob o impacto da expulsão de Bo Xilai, o ex-líder comunista que protagonizou o maior escândalo do país em décadas. Líder da megacidade de Chongqing até março, Bo Xilai foi afastado do cargo e acusado de corrupção e abuso de poder. Sua mulher, Gu Kailai, foi condenada a pena de morte com suspensão de dois anos pelo assassinato do empresário britânico Neil Heywood, que amanheceu morto em um hotel de Chongqing há um ano.
No discurso, Xi Jinping também deu destaque a questões de caráter social que estão no topo das preocupações dos chineses, ao lado da corrupção. Em uma lista das aspirações da população, ele mencionou a necessidade de melhoria nas seguintes áreas: educação, emprego, seguridade social, assistência médica, moradia e meio ambiente.
Xi só assumirá o terceiro e menos importante de seus cargos em março, quando Hu Jintao lhe entregará a presidência da China, durante o Congresso Nacional do Povo, o equivalente local de parlamento. No mesmo encontro, Li Keqiang receberá de Wen Jiabao o posto de primeiro-ministro do país.

http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,china-conclui-hoje-transferencia-de-poder-para-comite-liderado-por-jinping,960677,0.htm

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Circuncisão a tradição do corte

Símbolo da aliança divina para uns, ritual iniciático para outros, essa prática de mais de 5 mil anos tem justificativas religiosas, mitológicas e médicas.
por Malek Chebel


A circuncisão existe há mais de 5 mil anos. Ela é praticada numa vasta zona que vai da África subsaariana até o Oriente Próximo, incluindo a Pérsia, passando pelo Magreb, a Líbia e o Egito, a Palestina, a Síria, a Arábia e o Iêmen. Os turcos são circuncidados, assim como os muçulmanos da Ásia Menor. Judeus e muçulmanos do mundo inteiro são circuncidados, independentemente de suas convicções religiosas. Hoje em dia, o fator de integração e conformidade com a aparência física supera as crenças religiosas. Contabilizamos mais de 900 milhões de circuncidados no mundo, número que pode passar de um bilhão, se considerarmos a evolução do islamismo nas regiões sub-africanas e no Ocidente. Atualmente, as zonas de extensão da circuncisão são a Europa e os Estados Unidos. Por razões de higiene, a circuncisão ganha terreno, sobretudo, em meio laico.


Embora os historiadores tenham se limitado a conjeturas, sabemos que essa prática - como outras intervenções e marcas corporais - antecede todas as invenções da humanidade e até mesmo o monoteísmo. A Bíblia relata que na época de Abraão a circuncisão já era conhecida e praticada às margens do rio Jordão e na Samaria. 

Desde o princípio, essa prática inscreveu-se no registro do simbólico: "E a aliança que eu faço com vocês e com seus futuros descendentes, e que vocês devem observar, é a seguinte: circuncidem todos os homens. Circuncidem a carne do prepúcio. Este será o sinal da aliança entre mim e vocês. Quando completarem oito dias, todos os meninos de cada geração serão circuncidados; também os escravos nascidos em casa ou comprados de estrangeiros, que não sejam da raça de vocês" (Gênesis, XVII, 10-11).
Com exceção dos hieróglifos, estamos diante do texto mais antigo que trata de uma prática ligada ao órgão genital de mais de um bilhão de homens no mundo. Desde tempos remotos, ela envolveu inúmeros povos da Arábia-Iêmen, Etiópia-Sudão-Egito e Mesopotâmia, que estiveram entre os maiores inovadores de ritos sociais.
Heródoto confirma a antiguidade do costume: "[...] Os colquidianos, os egípcios e os etíopes são os únicos povos que sempre praticaram a circuncisão. Os fenícios e os sírios da Palestina reconhecem nesse hábito a influência dos egípcios; os sírios que vivem nos vales do Termodon declaram que esse costume foi introduzido em sua comunidade há pouco tempo pelos colquidianos". E o grande historiador de Halicarnasso conclui: "Egípcios e etíopes, eu não saberia dizer qual dos dois povos foi o primeiro a praticá-lo, pois trata-se de um costume muito antigo" (Histórias, II, 104).

Desde então, a ciência histórica não forneceu muitos dados sobre a prática da circuncisão. Afora o relato da Bíblia citado no início, não dispomos de documentos confiáveis que precisem o local de seu nascimento. "A circuncisão vem dos egípcios, dos árabes ou dos etíopes?", pergunta-se Voltaire, no século XVIII. E afirma: "Sei apenas que os padres da Antiguidade imprimiam em seus corpos marcas de sua consagração, assim como se marcava com um ferro ardente a mão dos soldados romanos" (Obras completas, tomo VII). Para responder parcialmente ao filósofo, sugerimos algumas pistas. Segundo pesquisas, a circuncisão teria nascido em solo africano e dataria de cinco a sete mil anos. Após sua implantação definitiva no leste do continente africano, ela teria migrado para o norte pelo rio Nilo, graças à dispersão de tribos estabelecidas na região.
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Entre os hebreus, o mohel ou moël é o responsável pela circuncisão, chamada hatâna. O rabino inicia o ritual com uma bênção para legitimar a exérese do prepúcio, possibilitando a denominação da criança. A circuncisão judaica, além de permitir o acesso à lei divina, representa o sinal da aliança com o povo eleito: "Minha aliança estará marcada na carne de vocês como aliança eterna" (Gênesis, XVII, 10-13).
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No que se refere à circuncisão entre os árabes, desde tempos imemoriais os habitantes da península Arábica, formada por Iêmen, Omã, Iraque e Palestina, praticam a circuncisão em meninos de 13 anos. Sabemos que esse costume originou-se com a circuncisão de Ismael, o antepassado dos árabes, filho do patriarca Abraão, que foi circuncidado aos 13 anos. A Bíblia, contrariamente ao Alcorão, relata esse episódio.

Há dois outros elementos importantes que contribuíram para a aceitação islâmica da circuncisão. Por um lado, o profeta Maomé (570-632) - nascido circuncidado segundo a lenda - nunca a proibira, e, por outro, a circuncisão tornara-se um privilégio matrimonial. Até o início do século XX, os jovens iemenitas de 16 anos deviam ser circuncidados perante suas prometidas, testemunhas da coragem e do estoicismo de seus futuros esposos.

No entanto, cabe enfatizar o propósito, talvez apócrifo, atribuído ao califa Umar (581-644), que dizia: "Maomé foi enviado ao mundo para islamizá-lo e não para circuncidá-lo". Seja como for, desde a chegada do islamismo e da sua extraordinária propagação, ela atingiu todos os países seguidores do culto de Alá.

Finalmente, servindo de base a todas as razões mencionadas e parecendo legitimá-las, a questão da higiene é recorrente no campo da peritomia. A própria circuncisão muçulmana a encerra em seu nome: tahara (purificação) no Magreb; sounna (tradição) no Sudão e no Egito, khotên na Turquia e na Pérsia e enfim taziinet (embelezamento) na Mauritânia.

Mas se a circuncisão é uma prática "fortemente recomendada", não é uma condição religiosa stricto sensu do islamismo nem uma prescrição da doxa. Ela é adotada em terra islâmica, inclusive pelos novos convertidos, mas não faz parte das cinco condições exigidas para ser um bom muçulmano: profissão de fé, prece, doação, jejum e peregrinação à Meca.
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Um rito, três justificativas
A circuncisão é justificada por três tipos de discursos. Cada cultura segue aquele que mais se enquadra a suas tradições e costumes

Mitológica
É aquela aplicada às tribos africanas e aos povos que seguem a circuncisão pré-monoteísta e profana, como ocorre nas ilhas de Vanuatu, na Austrália e ao sudeste da Nova Guiné.
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Religiosa
A circuncisão hebraica é o melhor modelo dessa vertente explicativa. De fato, o judaísmo considera a supressão do prepúcio como uma validação ou confirmação da adesão ao dogma. Fala-se, nesse caso, em "sinal de aliança" e "ingresso na Torá".

Quanto ao cristianismo, a circuncisão não é preconizada, mas sublimada a uma vocação espiritual. Lembremos da linha de demarcação introduzida pela literatura patrística. Filastro de Brescia fala da "circuncisão do coração", enquanto Tertuliano evoca a "circuncisão espiritual".

O islamismo não trouxe mudanças importantes ao rito. Para essa religião, a circuncisão implica uma purificação corporal, uma "prova" necessária ao fiel quando passa a freqüentar a mesquita. Dessa forma, sua função espiritual é relegada ao segundo plano. A explicação religiosa da circuncisão resume-se ao conceito de privar o homem de fatores exógenos que possam desviá-lo do caminho espiritual.

Médica
A explicação mais comum para os partidários atuais da circuncisão seria o fator higiênico. Em realidade, essa tese data de Filon de Alexandria (13 a.C. - 54 d.C.), filósofo judeu de origem grega que, em sua obra De circumcisione, chama a atenção para o fato de que a circuncisão garantiria uma maior higiene ao órgão genital masculino, evitando uma série de afecções como sífilis, fimose, herpes, balanopostites, falsa gonorréia, concentração de esmegma.
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Malek Chebel é antropólogo, psicanalista, especialista no mundo árabe e no islã; publicouHistoire de la circoncision des origines à nos jours (História da circuncisão das origens à atualidade, Balland. Coll. Le Nadir).

Para ler o texto na íntegra, basta acessar o site abaixo.
http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/circuncisao_a_tradicao_do_corte_imprimir.html

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Quem poderá salvar os guarani-caiovás?

09 de novembro de 2012 

WASHINGTON NOVAES
Há mais de 20 anos - 15 dos quais nesta página - o autor destas linhas escreve sobre a situação dramática dos índios guarani-caiovás, em Mato Grosso do Sul (MS). Naquele tempo já eram centenas os casos de suicídio entre essa gente (a segunda maior etnia indígena no País, 45 mil pessoas). E já nesse tempo eles não tinham onde viver segundo seus formatos próprios - as terras para as quais gradativamente os expulsavam eram muito pequenas, não permitiam manter a tradição de plantar, colher, caçar, pescar. Fora de suas terras, sem formação profissional adequada, seguiam a trajetória fatal: trabalhar como boias-frias, tornar-se alcoólatras, mendigos, loucos. E suicidas, como o jovem de 17 anos que se matou no dia seguinte ao de seu casamento - enforcou-se numa árvore e, sob seus pés, na terra, deixou escrito: "Eu não tenho lugar".
Quando ganhou espaço na comunicação a atual crise em dois hectares onde vivem 170 índios (Estado, 29/10), dois dias antes se suicidara um jovem de 23 anos, pelas mesmas razões. Felizmente, a desembargadora Cecília Mello, do Tribunal Regional Federal, determinou que os guarani-caiovás permaneçam na área até que se conclua a delimitação da que lhes deve caber - e onde estão "em situação de penúria e falta de assistência", o que, segundo ela, "reflete a ausência de providências do poder público para a demarcação das terras". Dizia o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), nesse momento, que 1.500 guarani-caiovás já se haviam suicidado.
Só pode levar ao espanto trazer à memória que havia 5 milhões de índios ocupando os 8,5 milhões de quilômetros quadrados em 1500, quando aqui chegaram os colonizadores - ou seja, cada um com 1,7 quilômetro quadrado, em média. E hoje os guarani-caiovás da aldeia em questão precisam ameaçar até com suicídio coletivo para manterem 170 pessoas em dois hectares, 20 mil metros quadrados, menos de 120 metros para cada um, pouco mais que a área de um lote dos projetos habitacionais de governos. Mas nem isso lhes concedem.
Talvez já tenha sido mencionado em artigo anterior pensamento do antropólogo Lévi-Strauss num de seus livros, no qual se perguntava por que os índios brasileiros, que eram milhões, não massacraram os primeiros colonizadores, que eram umas poucas centenas. Teria sido muito fácil. Mas ele mesmo respondia: não só não mataram, como os trataram como fidalgos; porque na cosmogonia do índio brasileiro está sempre presente a chegada do outro - e esse outro é o limite da liberdade de cada pessoa. Tal como pensava outro antropólogo, Pierre Clastres (A Sociedade contra o Estado): nas culturas indígenas não há delegação de poder, ninguém dá ordens; cada indivíduo é livre; mas o limite da liberdade de cada pessoa está em outra pessoa. Só que o respeito à liberdade dos colonizadores custou aos índios o massacre. E situações como as que vivem hoje.
De pouco têm adiantado relatórios de organismos internacionais, entre eles o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que destacam a importância (a começar pelo Brasil) das áreas indígenas para a conservação da biodiversidade, em perigo no mundo. Também têm sido esquecidas as lições do jurista José Afonso da Silva, que com seu parecer levou o Supremo Tribunal Federal a decidir pelo direito dos índios ianomâmis à demarcação de suas reservas, em Roraima: é um direito reconhecido desde as ordenações da coroa portuguesa, no século 17.
Mas quem comove o poder brasileiro? Ainda no ano passado - talvez também já tenha sido comentado aqui -, quando completou meio século a criação do Parque Indígena do Xingu pelo presidente Jânio Quadros, por proposta dos irmãos Villas Boas, o autor destas linhas, com apoio do ex-ministro Gilberto Gil, do artista plástico Siron Franco, do compositor e criador Egberto Gismonti, do ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) Márcio Santilli - entre muitas outras pessoas -, tentou levar à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) a proposta de transformar o parque em patrimônio ambiental, histórico e cultural da humanidade. Afinal, naqueles 26 mil quilômetros quadrados, onde vivem 16 povos, está um pedaço riquíssimo do patrimônio ambiental brasileiro - de sua flora, sua fauna, seus recursos hídricos -, hoje cercado pelo desmatamento e pelo plantio de grãos; um pedaço importante da nossa História, pois a presença de etnias por ali tem mais de 2 mil anos; um pedaço valioso do patrimônio cultural, com todas as manifestações lá nascidas e que perduram. Mas para que a Unesco receba um pedido como esse é imprescindível - foi-nos dito - que ele tenha o aval de alguma autoridade brasileira. E não conseguimos sequer uma audiência da Funai ou de outro órgão para expor o pleito.
Não estranha. Aprendemos mais uma vez que uma iniciativa como essa é considerada "ameaça à soberania nacional e ao uso de recursos naturais". Tal como já acontecera em 2002, quando o autor destas linhas, membro da comissão que preparava o projeto da Agenda 21 brasileira, observou, numa reunião, que faltava no texto um capítulo sobre clima e mudanças nessa área. E propunha que ele fosse escrito. Imediatamente o representante do Itamaraty na comissão se levantou e impugnou a proposta, alegando que "essa área, que envolve a soberania brasileira, é privativa das Forças Armadas e do Itamaraty". Ponto final. Já promulgada a Agenda, no início do novo governo, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) pediu que este escriba a representasse na Comissão da Agenda. A proposta do capítulo sobre clima e desenvolvimento sustentável foi reapresentada e aprovada em princípio. Mas jamais foi discutida. Morreu.
Tampouco estranha, assim, que os guarani-caiovás enfrentem esse calvário. Se o Parque do Xingu não pode ter prioridade, se centenas de milhares de índios em todo o País vivem um drama diário, que importância tem para o poder a sina de algumas dezenas de guarani-caiovás perdidos em meio à soja sul-mato-grossense?
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,quem-podera-salvar-os-guarani-caiovas-,957849,0.htm

José Dirceu já entregou passaporte no STF


Assim como ex-ministro, Valério e outros três réus atenderam a determinação do relator Joaquim Barbosa

09 de novembro de 2012
Mariângela Gallucci, de O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e mais quatro condenados por envolvimento com o mensalão já entregaram seus passaportes no Supremo Tribunal Federal (STF). Eles atenderam a uma determinação do relator do processo, Joaquim Barbosa, para que fossem apreendidos os documentos dos 25 réus considerados culpados pelo STF.
Além de José Dirceu, o publicitário Marcos Valério, o advogado Rogério Tolentino, o ex-deputado Pedro Corrêa e o ex-assessor João Cláudio Genu protocolaram os documentos de viagem no STF. Outros 20 réus condenados, entre os quais o ex-presidente do PT José Genoino, também precisam entregar o documento.
O prazo para que obedeçam à determinação do Supremo é de 24 horas após a intimação da decisão de Joaquim Barbosa que determinou a apreensão dos passaportes, inclusive os estrangeiros. Os réus ainda não foram intimados e, portanto, o prazo não começou a contar.
No despacho, Joaquim Barbosa fez críticas ao comportamento de alguns réus. "Uns (réus), por terem realizado viagens ao exterior nesta fase final do julgamento. Outros, por darem a impressão de serem pessoas fora do alcance da lei, a ponto de, em atitude de manifesta afronta a este Supremo Tribunal Federal, qualificar como ''política'' a árdua, séria, imparcial e transparente atividade jurisdicional a que vem se dedicando esta Corte, desde o dia 2 de agosto último", disse.
Em resposta à decisão, José Dirceu publicou em seu blog na quinta-feira, 8, que o despacho de Joaquim Barbosa "é puro populismo jurídico e uma séria violação aos direitos dos réus ainda não condenados". Para o ex-ministro da Casa Civil, a decisão "é tentativa de intimidar os réus, cercear o direito de defesa e expor os demais ministros ao clamor popular".
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,jose-dirceu-ja-entregou-passaporte-no-stf,958090,0.htm

Economias de China e Índia vão superar o G-7 em 2025


Relatório da OCDE aponta que a economia global passará por uma mudança radical na distribuição da produção 

09 de novembro de 2012 
Danielle Chaves, da Agência Estado
LONDRES - Com as políticas corretas a economia global poderá manter um nível de crescimento relativamente alto durante as próximas décadas, mas passará por uma mudança radical na distribuição da produção se tiver sucesso com isso, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em um relatório sobre projeções para os eventos econômicos até 2060, a OCDE afirmou que a produção econômica global crescerá 3% anualmente durante os próximos 50 anos se os governos encontrarem meios de manter as pessoas trabalhando por mais tempo, resolverem as atuais dificuldades fiscais e reformarem suas economias para torná-las mais produtivas.
Com as taxas de crescimento dos países em desenvolvimento superando as dos países desenvolvidos, a OCDE acredita que a produção combinada da China e da Índia vai superar a produção combinada do G-7 em 2025. Até 2060 as economias da China e da Índia combinadas serão 50% maiores do que a do G-7 - no ano passado essa relação era de menos da metade. De fato a OCDE calcula que em 2060 o Produto Interno Bruto (PIB) dos dois países será maior do que o de todos os 34 membros da instituição.
A OCDE prevê que o PIB da China medido pela paridade do poder de compra será maior do que o da zona do euro já neste ano e excederá o dos EUA em "mais alguns anos". No entanto, a própria China deverá ser superada como a grande economia com o crescimento mais rápido por volta de 2020, à medida que sua população envelhecida for deixada para trás pela força de trabalho mais jovem da Índia e da Indonésia.
Mudanças demográficas provocarão a maioria dos eventos que a OCDE espera para os próximos 50 anos. Até 2030, uma população global mais velha estará poupando menos, com a consequência de que as taxas de juros serão mais altas e os investimentos serão menores, agindo como uma trava ao crescimento.
A OCDE destacou que encontrar um meio de manter a proporção de população ativa em relação à população total, mesmo com o envelhecimento previsto, será a chave para que se alcance um crescimento econômico de 3%. As informações são da Dow Jones.
http://economia.estadao.com.br/noticias/economia,economias-de-china-e-india-vao-superar-o-g-7-em-2025,134219,0.htm

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Eleição americana começa com prévias e termina com delegados

DE SÃO PAULO

O caminho para chegar à Casa Branca dura vários meses. Primeiro, os pré-candidatos de cada partido se enfrentam em votações prévias. Depois de nomeados, eles disputam a preferência dos cidadãos de olho no mapa eleitoral, que define a divisão, Estado a Estado, do número de delegados (representantes partidários) que compõem o chamado Colégio Eleitoral.
São esses delegados, orientados pelo voto da maioria da população no seu Estado de origem, que elegerão o novo presidente.

Entenda o passo-a-passo do processo:

domingo, 4 de novembro de 2012

Seu lixo, comida de famintos

Estudo aponta que redução no desperdício poderia alimentar até um bilhão de pessoas. Especialistas ressaltam, porém, que é preciso garantir o acesso aos produtos agrícolas             Globo Ciência - 04/11/2012     

Brasil. O volume de alimento no lixo é de 26,3 milhões de toneladas anuais Foto: Márcia Foleto
Brasil. O volume de alimento no lixo é de 26,3 milhões de toneladas anuais (Márcia Foleto)

Dentro de uma lixeira da Central de Abastecimento (Ceasa) do Rio de Janeiro, há pouco mais de uma semana, a dona de casa Elizabeth de Moraes separava cebolas inteiras, batatas menos machucadas, cenouras sem raiz. Limpava tudo com um papel e punha em um carrinho. Em vez de percorrer barracas, é ali que ela faz a feira da família. Uma vez por semana, sai de Santa Cruz, onde mora com o marido, uma filha e três netos, e vai até a Ceasa, em Irajá, onde, segundo a Embrapa Agroindústria de Alimentos, nada menos do que dez toneladas de alimentos vão parar no lixo diariamente. Assim Elizabeth diz ter criado seus dez filhos, contando, semanalmente, com os alimentos descartados por feirantes no local. A cena carioca é um retrato de proporções mundiais alimentada pelo desperdício, que, se fosse atacado, abriria espaço para saciar a fome de um bilhão de pessoas mundo afora, sendo que 19 milhões no Brasil — mais do que os 13 milhões de brasileiros com fome.
O cálculo famintos versus desperdício é de pesquisadores da Universidade finlandesa de Aalto e foi publicado, este mês, na revista americana “Science”. Para outros especialistas, porém, a conclusão sobre a redução da fome pode ser precipitada, uma vez que não leva em conta o tipo de alimento descartado e a qualidade do produto, além da forma de acesso das populações mais pobres aos produtos agrícolas, considerados commodities. As Nações Unidas cravam que 870 milhões de pessoas passam fome, seja porque não têm terra — o que dificulta a agricultura de subsistência — ou porque não têm dinheiro para pagar o preço de mercado.
Estamos jogando fora não somente alimentos, mas também água potável (27 metros cúbicos por habitante do mundo), energia, terra (0.031 hectares de área agricultável), trabalho e fertilizantes (4,3 quilos).
— As perdas ocorrem em toda a cadeia produtiva. O consumidor paga por isso — diz Antônio Gomes, pesquisador da Embrapa.
Só no Brasil, 26,3 milhões de toneladas de alimentos têm o lixo como destino. Deste total, cerca de 10% se perdem ainda no campo. O maior desperdício, 50%, ocorre no transporte e manuseio. E 10% vão para a lixeira após a chegada do produto ao supermercado, quando ele perde qualidade na prateleira, ou simplesmente, quando comprado em excesso, não é consumido. As centrais de abastecimento espalhadas pelo país ajudam a engordar a conta: mais de 30% das perdas em toda a cadeia alimentar acontecem nesses locais.
Um passeio matinal na Ceasa do Rio é um cenário privilegiado para presenciar comerciantes descartando caixotes cheios de alimentos no chão. Há produtos que perderam qualidade no transporte, alguns ao serem embalados, outros por causa do armazenamento e até na própria disposição nas barracas. Na correria, os feirantes jogam alimentos uns por cima dos outros, e os estragam. As cenas se repetem em todas as semanas em feiras livres do Rio de Janeiro.
Em Botafogo, na semana passada, um comerciante carregava quatro caixas cheias de alfaces para o lixo, no fim da feira. Ninguém quis comprar porque o produto murchou demais. Sobre a perda, ele deu de ombros. Está acostumado, já entra na conta. E, como ele, muitos outros fazem do alto índice de descarte parte do cotidiano.
— Dez anos atrás, fizemos um cálculo da cadeia de alimentos, e concluímos que havia 37 quilos de hortaliças não consumidas por cada habitante do país. Ainda não refizemos as contas, mas acompanhamos o cenário e já sabemos que o número quase não se alterou. Não é à toa que na Ceasa do Rio há, até hoje, uma comunidade do entorno que se alimenta do lixo que é descartado — analisa Gomes.
Banco de alimentos
A Ceasa do Rio alega dispor de um programa de Banco de Alimentos, em Irajá. A instituição doa, mensalmente, de 40 a 50 toneladas do que não pode mais ser vendido nos boxes para 60 instituições cadastradas. Os estoques próprios para consumo, mas sem valor comercial, vão para o banco, onde são selecionados e separados. Dentro do projeto do Banco de Alimentos, a central de distribuição também oferece cursos de reaproveitamento integral do alimento para os responsáveis pelas cozinhas. A empresa reconheceu, no entanto, que nem todos os comerciantes da Ceasa buscam rotineiramente o Banco de Alimentos para doar.
Como parte da tentativa de erradicação da fome, Bancos de Alimentos proliferaram por todo o país. Mas há uma série de entraves para as doações, que amedrontam empresas. Segundo a legislação brasileira vigente hoje, as companhias respondem judicialmente se o alimento causar algum mal à pessoa que o consumir. Sendo assim, há estabelecimentos, como restaurantes e supermercados, que preferem descartar produtos em bom estado no lixo a doá-los. Por outro lado, nutricionistas criticam possíveis mudanças na legislação atual, já que há empresas dispostas a se livrar do lixo.
O professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Renato Maluf, está convencido de que é preciso separar o joio do trigo para entender a complexidade do problema. No caso, distinguir as perdas do desperdício. As primeiras se referem ao cultivo, à colheita, manipulação dos alimentos, embalagem, distribuição etc. Ou seja, acontecem em algum momento da cadeia produtiva. Já o desperdício acontece em casa. O especialista acaba de deixar a presidência do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea):
— As perdas podem ser reduzidas com investimentos em técnicas. Há agricultores que perdem alface por não saberem manejar o pé da forma correta. Tem também a aparência, o cuidado na hora de expor o alimento. Outra coisa é o desperdício. Ele é questão de educação alimentar, tem a ver com excesso de compra, má gestão dos alimentos em casa, não aproveitamento integral dos talos, cascas, entre outros. E isso não se muda da noite para o dia. Há muito preconceito envolvido.
Mal do século
Maluf não concorda com a relação direta feita pelo estudo de Aalto entre desperdício e redução da fome, pois ressalta que o problema não é relacionado à quantidade de alimentos disponíveis, mas ao acesso. A grande pergunta para ele é: se houvesse mais alimento disponível, ele iria parar nas mãos das camadas pobres? Nesse ponto, como o professor ressaltou, é necessário pensar em muito mais do que doação de alimentos, mas também na possibilidade de compra de cada habitante do planeta sustentar sua dieta alimentar.
Em pleno século XXI, 870 milhões de pessoas vão dormir diariamente com fome. Isso significa que 12,5% da população mundial estão subnutridas, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, sigla em inglês). A propósito da divulgação dos novos números, seu diretor-geral, o brasileiro José Graziano da Silva, escreveu: “não há escassez de oferta ou deficiência tecnológica que justifique esses indicadores”.
Há de se ressaltar, ainda de acordo com o relatório da FAO, intitulado “O Estado da Insegurança Alimentar no Mundo”, que o número total de pessoas famintas no mundo diminuiu em 132 milhões entre 1990 e 2012. E o Brasil aparece no documento como exemplo, já que o percentual no país caiu de 14,9%, no período de 1990 a 1992, para 6,9%, nos anos de 2010 a 2012.
Se o país viu a fome diminuir quase à metade nos últimos anos, o fenômeno teve pouco a ver com a redução do desperdício e mudanças na cadeia produtiva em solo brasileiro. E, quando elas ocorrem, segundo especialistas, é, na maior parte das vezes, por exigências feitas pelo mercado externo. São condicionantes que passam por exigências fitossanitárias, regras de embalagem, formas de acesso a mercados. Há casos em que os mesmos produtores de agronegócio têm uma cadeia de embalagem e de distribuição mais cuidadosa para a exportação, e um padrão menos exigente para os produtos vendidos no mercado interno.
Uso incorreto dos recursos
Além do consumidor pagar o preço da ineficiência do mercado, o desperdício se traduz em mau uso dos recursos naturais do país, como ressaltou o professor Maluf:
— A grande questão do desperdício e das perdas é que temos sobreuso dos recursos naturais para uma produção que se perde. Poderíamos ter uma produção maior, pressionando menos o meio ambiente, gastando menos energia, com áreas menores.
O pesquisador defende a ideia do circuito curto, no qual pequenos produtores fazem a distribuição voltada para uma área mais próxima. O modelo encurta distâncias e diminui as perdas. A opinião é compartilhada por uma das mais respeitadas autoras da área de Segurança Alimentar no mundo, a indiana Vandana Shiva.
— As longas distâncias e a distribuição centralizada também contribuem para o desperdício. O modelo industrial que destrói ecossistemas e impõe a monocultura só agrava o problema. Além disso, é preciso lembrar que apenas 2% da soja produzida nos Estados Unidos é para fins alimentares. Fenômeno parecido acontece no Brasil — afirma Shiva. — O primeiro passo para acabar com o problema é trazer de volta a diversidade de produção para as fazendas. Assim, também se garante geração de renda para os agricultores, reduzindo a fome.
Há, por um lado, mudanças que dependem de empresas, políticas públicas e mais cobrança do poder público. Por outro, há atitudes que dependem da sociedade. Pensando nisso, a ONG internacional Oxfam acaba de lançar um manual sobre o desperdício para os consumidores. Entre as dicas, estão ações como aproveitar ao máximo os alimentos, pensar em receitas específicas para usar os que estão prestes a estragar na geladeira e consumir produtos de acordo com a estação. Segundo um dos coordenadores da campanha no Brasil, Rafael Georges, o objetivo é conscientizar as pessoas de que um terço dos alimentos se perde em toda a cadeia:
— O consumidor precisa pensar na origem do produto. Alimentos distribuídos por pequenos produtores, frescos e não processados, exigem muito menos energia, fertilizantes e são mais diversos.
Filme verdade
O documento ganhou o título de “A transformação do sistema alimentar: utilizando o poder do consumidor para criar um futuro alimentar justo” e pode ser baixado na internet, pelo endereço eletrônico http://issuu.com/campanhacresca. A pesquisa ressalta também o excesso de consumo, que acontece nos países desenvolvidos. A maioria dos alimentos do mundo está no Norte e no Ocidente, sendo insuficiente em outros lugares. Na Europa, os mercados e estabelecimentos comerciais têm alimentos em quantidades suficientes para oferecer mais de 3 mil calorias por dia a toda e qualquer pessoa. Nos Estados Unidos, esse número gira em torno de 3.600 calorias. Em média, uma pessoa precisa ingerir por volta de 2 mil calorias por dia.
No Brasil, os excessos são menores, os maiores problemas são de fato as perdas da produção até o consumo. E não é recente. Há 17 anos, uma produção cinematográfica, de 1989, que fez a cadeia produtiva de um tomate se tornar protagonista de um curta-metragem, foi eleito, pela crítica europeia, como um dos cem mais importantes do século.
O documentário “Ilha das Flores”, de Jorge Furtado, mostrava a problemática da sociedade de consumo, a riqueza e a desigualdade. O filme ajudou a refletir sobre o estágio em que chegou o ser humano em busca de alimento, e diante da abundância que há nas prateleiras dos supermercados. E ainda mostrava as perdas na cadeia de produção de alimentos, da colheita até chegar ao supermercado, e o desperdício que ocorre na hora do consumo. Por fim, o tomate apodrece e acaba no lixão, onde pessoas disputam os restos de comida, mas só depois de rejeitados pelos porcos criados no local.

http://oglobo.globo.com/ciencia/seu-lixo-comida-de-famintos-6583250


Divisão do trabalho em casa tem avanços só da porta para fora


Em uma década, tempo gasto semanalmente por homens em afazeres domésticos cresceu só oito minutos

Linda Cruz cuida sozinha da casa e dos filhos. Cláudio Alencar reconhece que 99% do trabalho ficam com a mulher
Foto: Hans von Manteuffel / Agência O Globo
Linda Cruz cuida sozinha da casa e dos filhos. Cláudio Alencar reconhece que 99% do trabalho ficam com a mulher (Hans von Manteuffel / Agência O Globo)



RIO E RECIFE – “Antes de Cristo vir à Terra, a mulher já tinha essa missão”, com essa declaração o pernambucano Cláudio Alencar resume o que pensa sobre a divisão do trabalho doméstico. Ele reconhece, sem qualquer constrangimento, que deixa 99% dos serviços da casa para a mulher, Linda Cruz.
 Essa divisão desigual dos serviços do lar e do cuidado dos filhos permanece congelada no tempo. Pelos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, os homens que trabalham dedicavam 10 horas semanais aos afazeres domésticos em 2001. Em 2011, faziam 10 horas e oito minutos. Enquanto as mulheres que trabalham destinavam 24 horas e quatro minutos no início da década passada. Em 2011, a atividade consumia 22 horas e 13 minutos.

A situação se torna mais injusta diante da presença da mulher no mercado de trabalho. Ela responde por 42% da força de trabalho ocupada do país e por 41% de toda a renda gerada pelas famílias. Uma presença indispensável, diante de um mercado de trabalho onde a mão de obra fica cada vez mais disputada no país presidido por uma mulher.
Somando-se as 22 horas do trabalho doméstico à jornada média de trabalho pago de 39 horas em São Paulo, pelos dados do Dieese, a mulher tem uma carga de 61 horas semanais. E a liberação da mulher desse trabalho requer, além da maior responsabilidade masculina no cuidado da casa e dos filhos, políticas públicas, segundo a socióloga da Unicamp, Elisabete Dória Bilac. Políticas como creches e instituições para cuidado de idosos, trabalho que a sociedade deixa em mãos exclusivamente femininas. No Brasil, somente 20,8% das crianças de 0 a 3 anos estão nessas instituições. Tatau Godinho, secretária nacional de Avaliação de Políticas e Autonomia Econômica da Secretaria de Políticas para as Mulheres, diz que o governo tem meta de construir 6 mil creches até 2014:
— Sabemos que a cobertura não é suficiente, mas cresceu muito.
Em 2004, a rede atendia 13,4% de crianças na faixa etária. Sobre os idosos, Tatau diz que começam a aparecer instituições de longa permanência de idosos e hospitais dia para suprir esse trabalho feminino.
— Nos meios de comunicação e, principalmente, nas propagandas, esse papel da mulher competente, que ganha bem e cuida de tudo da casa e dos filhos fica cada vez mais marcado — diz Tatau.
Para cumprir todos os papeis, Linda se desdobra, sem ajuda do marido:
— Faço força para chegar cedo, para dar conta do recado. A correria é muito grande, ando muito em casa e de noite sinto cansaço nas pernas, como se estivessem podres.
Ela não sabe quantas horas gasta trabalhando por dia, somados os serviços pagos e os domésticos:
— Nunca nem parei para fazer essa conta, nem quero — avisa.
E a sobrecarga tem reflexos na saúde da mulher. Ginecologista há 27 anos, Elisabete Dobao viu crescer os casos de depressão e síndrome do pânico.
— A mulher não freia nunca. Não há sistema que aguente. Não somos feitos para funcionar permanentemente. Acontecem alterações hormonais, piorando a TPM. Ela começa a ganhar peso, a memória fica fraca, aumenta a ansiedade. É uma cobrança muito grande. Ela tem que ser bonita, gostosa, sem celulite, sem estria, com cabelo arrumado, unha feita, pele sem mancha, ser supercompetente, ganhar bem, ter casa limpa e arrumada estilo “Caras” e filhos bem educados e que te amem. Uma verdadeira família margarina.
Licença-paternidade pode aumentar
A empresária Mônica Medina sabe bem como é isso. Já saiu de uma reunião de meia fina e salto alto direto para uma festa do Dia das Mães. A festa era uma gincana, na areia. Tudo pelo filho: arrancou os sapatos e passou a correr de tailleur. Mesmo com empregada, babá e motorista, a responsabilidade pelos filhos ficava mais para ela.
— Não dá para contar com os homens quarta-feira e domingo, porque há o futebol. O pior é levar horas arrumando as crianças para as festas infantis e, depois, eles é que são os heróis. Descansados, participavam mais das brincadeiras. E era assim com todos os casais com que convivíamos.
Hoje, separada e com os dois filhos criados, dedica mais tempo para o hobby de cozinhar:
— Antes meu hobby era dormir.
O objetivo de Linda é fazer o marido levar as crianças para a escola.
— Esse ano fechei questão e quem leva é o marido mesmo. Só faço isso quando ele está viajando — afirma.
Tatau, da secretaria da mulher, diz que é possível ampliar o papel do homem no cuidado dos filhos. A ampliação da licença-paternidade é um exemplo. Para Elisabete, da Unicamp, a mulher também precisa abrir mão do poder dentro de casa.
— Há uma dimensão do poder feminino no espaço privado. As decisões domésticas são da mulher.

http://oglobo.globo.com/economia/divisao-do-trabalho-em-casa-tem-avancos-so-da-porta-para-fora-6628065